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Prof. Rivail: o grande educador de almas

05 de Outubro de 2020 às 12h00

Outubro é para nós espíritas, um mês de celebração, especialmente o dia 3 de outubro, por fazer alusão à data de aniversário, de (re) nascimento daquele que se tornaria um dos mais respeitáveis pedagogos da França, no séc. 19, o professor Hippolyte Léon Denizard Rivail e que, posteriormente, se tornaria o grande ícone do Espiritismo, conhecido pelo pseudônimo de Allan Kardec. É sobre este, ainda ilustre desconhecido até mesmo entre boa parte dos espíritas e simpatizantes do Espiritismo que gostaria de falar, como forma, inclusive, de prestar aqui uma singela homenagem a este ser que desempenhou um papel tão importante na história da humanidade e, particularmente nas nossas vidas, pois sem o trabalho desenvolvido por ele, nós certamente não estaríamos reunidos aqui nesta ocasião.

Claro que falar da vida e do legado de alguém tão ilustre e de fundamental importância para o Espiritismo, demandaria um tempo muito maior, razão pela qual me deterei em falar mais especificamente acerca de alguns dos traços biográficos que evidenciam um pouco da nobreza e do caráter que definiram o espírito de Hippolyte Léon Denizard Rivail e, um pouco da grandeza do legado deixado por ele enquanto um grande educador no sentido maior que este termo traz em si e que o revelou um verdadeiro educador da alma humana. Em outras palavras, tentarei apresentar um breve perfil do ser humano notável daquele que esta por trás do pseudônimo de Allan Kardec.

Para isso, me valerei de duas fontes que quero aqui destacar e, inclusive, deixar como referência para quem desejar se aprofundar mais a respeito da vida e legado do nobre personagem aqui mencionado,foram elas: o artigo intitulado: “O Homem por detrás do nome”, de autoria do conferencista e estudioso espírita Marcelo Henrique e, a cinebiografia extraordinária de Wagner de Assis, intitulada: “Kardec: a história por detrás do nome”, uma produção nacional com a direção e roteiro de Wagner de Assis”, lançada ano passado e acredito que já visto se não por todos, certamente pela maioria dos que nos acompanham neste instante.Além, é claro, do livro “Kardec, a biografia”, do jornalista Marcel Souto Maior que serviu de base para o filme. Estes documentos, por sua vez, evidenciam o destaque que vem sendo dado neste início de novo século 21, algumas das muitas pesquisas históricas e documentais têm sido feitas em torno deste valoroso personagem, resgatando não apenas a sua memória e a sua condição de grande homem, mas consequentemente, a essência da gênese do pensamento espírita.

Quem foi Rivail
Acredito que o primeiro aspecto importante que nos leva a uma compreensão acerca do personagem aqui destacado é sabermos quem foi o homem, o espírito reencarnado e conhecido pelo nome de Hippolyte Léon Denizard Rivail, o qual antes mesmo de se tornar Allan Kardec como passou a ser mais conhecido, foi um dos maiores e mais respeitados educadores franceses, do século 19, muito embora o seu nome não tenha sido registrado nos anais da história oficial ao lado dos renomados pedagogos e pensadores daquela época, algo, alias, que se torna compreensível se levarmos em consideração o destino reservado para ele em outro capítulo da história. Nesse sentido, penso ser importante termos ciência sobre quais anseios o motivaram antes mesmo de ele abraçar a dura e valiosíssima missão que foi dar corpo a densa e complexa obra que entrelaça ciência, filosofia e religião na acepção maior que este termo revela e que extrapola o modo como comumentemente é concebido e empregado, ou seja, como um sistema convencional de crença, de fé.

E, nesse sentido, vale destacar que o nosso ilustre aniversariante nasceu no dia 3 de outubro de 1804, portanto, há 216 anos atrás, na cidade de Lion, na França que, não por acaso era o grande centro intelectual de toda a Europa e referência para todo o mundo. Rivail nasceu filho do juiz católico Jean-Baptiste-Antoine Rivail, e a mãe, a dona de casa Jeanne Duhamel, os quais o conduziram, aos 10 anos de idade para estudar na suiça, no instituto de Iverdon, fundado e mantido pelo ilustre pedagogo Pestallozi, de quem ele se tornaria discípulo, influenciado pelas suas ideias revocionarias na época (Essa versao é constestada por alguns pesquisadores que alegam que na verdade Rivail cresceu distante da figura do pai e fora conduzido à Suiça pela mãe e sua vó). Em 1820, o jovem Rivail instalou-se em Paris onde começou a dar aulas de matemática, física, química, astronomia, anatomia e francês, revelando, portanto, a sua grande vocação e interesse pelo mundo das ciências.

O CASAMENTO COM A JOVEM TALENTOSA AMÉLIE BOUDET
Em 1832, casa-se com aquela que seria sua grande e estimada companheira de vida e de luta, a jovem de inteligência admirável e generosa Amélie Boudet que se tornaria a madame Rivail. Aquela em quem ele encontraria todo o apoio para os dias de lutas difíceis que estariam ainda por vir. Juntos eles enfrentaram as dificuldades financeiras que persistiram durante toda a década de 1830, quando ele reforçou a renda escrevendo gramáticas e aritméticas — e até mesmo uma peça, chamada Uma Paixão de Salão, levada aos palcos em 1843, realçando, portanto, um pé no mundo das artes e a sua sensibilidade, demonstrando assim que não se tratava de um homem exclusivamente racional, frio, como costuma-se inclusive, imaginar-se a figura de Kardec, um cientista sisudo, como é visto os homes de ciencia. Para driblar a forte crise econômica que abatia toda a Europa naquela época, o prof. Rivail chegou a usar dos conhecimentos matemáticos em serviços de contabilidade prestados a pequenas companhias, enquanto sua fiel e generosa companheira oferecia cursos gratuitos a pessoas de pouca condição financeira, dentro da própria residência do casal.

O ESPÍRITO CONTESTADOR E O CONFLITO COM A IGREJA
Essa polivalência toda de Rivail foi que o ajudou a enfrentar outra fase ainda mais difícil que ele e a madame Rivail encarariam, principalmente em decorrência do conflito ideológico entre o cidadão francês Denizard Rivail – o qual não abria mao de seus princípios e valores - e a cátedra do sistema de ensino oficial da época que sofria grande interferência do alto clero sob a concordância do imperador Napoleão III, conflito este que resultou na interrupção de sua carreira de magistério público na instituição em que lecionava já há um certo tempo. Esse episódio foi evidenciado no filme Kardec, quem assistiu deve se recordar e que revelou a face contestadora e de homem público atuante, ativo em defesa daquilo em que ele acreditava, no caso, em defesa do ensino totalmente laico, sem a interferência da Igreja, instituição essa que, como sabemos, posteriormente voltaria a se conflitar com ele na condição de codificador do Espiritismo.

O PERFIL DE GRANDE EDUCADOR E A LUTA PELA MELHORIA DO ENSINO PÚBLICO
Esse espírito de bravura do professor Rivail que, como se perceber, foi um pedagogo diferenciado e que foi muito mais alem do mero ofício de ensinar, engajando-se numa luta em nome daquilo em que ele acreditava piamente como a maior ferramenta de transformação do espírito humano e da sociedade: a educação, revelava o tamanho de sua grandeza e o quanto ele estava de fato preparado para abraçar aquela que seria a grande missão de sua existência: se tornar o codificador, o grande regente da doutrina dos espíritos.

E esse amor e dedicação plena a educação o acompanhava desde cedo. Ainda jovem, aos vinte e poucos anos de idade, na qualidade de crítico inconformado com o sistema educacional francês, Rivail não só apontou o que ele considerava falho, como apresentou propostas político-pedagógicas de renovação do sistema educacional. E isto ficou bastante patente num dos documentos escritos por ele em 1828 que foi o Plano Proposto para a Melhoria da Educaçao Pública, por meio do qual ele apresentava uma concepção de educação mais ampla e multidimensional em consonância com o pensamento de mestres de quem ele se tornara discípulos a exemplo de Russeau e Pestalozzi. E, nele, Rivail defende o papel que deve ser exercido pela educação no complexo e desafiante processo de desenvolvimento integral dos indivíduos e da sociedade, destacando o tríplice aspecto de mudanças gerais ao defender que a educação se bem entendida e aplicada acarreta em mudanças não apenas intelectuais e físicas mas também morais. E é justamente aqui que ele traça, mesmo que inconsciente, um elo com aquilo que é o cerne do caráter revolucionário do Espiritismo: a moral.

Como se pode perceber, muito mais que modificar o sistema educacional, de ensino público francês, as ideias do jovem professor defendia algo muito maior que era uma transformação da humanidade a partir das faculdades morais que, juntamente com as faculdades intelectuais formam, como sabemos, as duas asas que elevam e levam o espírito humano ao mais alto vôo do progresso espiritual. Ali, Rivail se revela muito mais que um homem de seu tempo, antenado com os problemas do contexto histórico-social, mas sim, um espírito visionário, para além de seu tempo, conectado com as ideias e propostas que, inclusive, seriam apresentadas mais tarde pelas teses da Escola Nova, do construtivismo piagetiano e da visao apresentada a UNESCO pela Comissao Internacional sobre Educaçao p o século XXI, que destaca como princípio os 4 pilares da educação contemporânea: conhecer, fazer, conviver e ser. Pilares esses que dialogam com o que esta posto no L. E, mais particularmente no Cap. 7: Da lei de Sociedade em que nos é dito que necessitamos da vida em sociedade para desenvolvermos todas as nossas aptidões, inclusive, e sobretudo, as morais.

O ASPECTO HUMANITÀRIO DE RIVAIL
Não poderíamos deixar de destacar também aqui outro traço marcante do perfil do ser que foi o prof Rivail que era o de sua humanidade. Alem de lutar em defesa da educação não apenas no sentido instrucional, mas como ferramenta de alavancamento moral, ele também demonstrava uma grande preocupação com os mais pobres, como por exemplo, os moradores de rua dos arredores que ele costumava ajudar, doando, sobretudo, alimento.  Esses dois aspectos nos colocam diante de um cidadão Frances de personalidade firme, militante, e profundamente generosa. De tal modo que, relatam os escritos sobre ele que, ao atravessar as dificuldades financeiras, uma das preocupações dele era a de como seguir ajudando os mais vulneraveis. Portanto, não restam dúvidas de que, era esse o ser de quem a espiritulidade maior podia contar para a grande missão que estaria por vir...

TRABALHO COMO MAGNETIZADOR

Outra faceta do prof. Rivail dizia respeito ao seu envolvimento com a corrente de estudos do Magnetismo Animal, por meio da qual ele ajudava pessoas a se curarem de problemas de saúde, muitos tidos como paranormais a exemplo de transtornos de sonambulismo. Como magnetizador ele chegou a figurar nos quadros da Sociedade de Magnetismo de Paris, a mais importante da França. Foi por meio de um de seus amigos magnetizadores, Fourtier, que ele foi levado, em 1854, a analisar o curioso e fascinante fenômeno das mesas girantes que, como todos sabemos, terminou levando-o ao contato com o mundo espiritual e consequentemente mudando por completo os rumos da sua vida. Movido pelo espírito de homem de ciência e munido de critérios metodológicos rigorosos deu início aos estudos que resultaram na codificação da doutrina dos espíritos, a maior experiência científica e filosófica já realizada até a presente data sobre o fenômeno da intervenção do mundo espiritual sobre o mundo físico.

O NASCIMENTO DE ALLAN KARDEC E O ESPIRITISMO

E assim nasceu o Espiritismo, apresentado oficialmente á sociedade parisiense e o mundo através do lançamento de O Livro dos Espíritos, em 18 de abril de 1857, o qual é assinado pelo pseudônimo Allan Kardec, cujas razões não serão aqui detalhadas pois acredito já serem bastante conhecidas de todos. Dentro do que foi proposto para esta fala, penso que se faz importante e coerente destacar aqui, a grandeza com que Allan Kardec levou a diante a missão abraçada por ele e, é importante destacar, a sua companheira, Emélie Rivail, os quais dedicaram-se de corpo e alma ao árduo e exaustivo trabalho que consumiu não apenas todo o restante de tempo de vida do professor Rivail, como toda a sua energia psíquica e espiritual.

Quem chegou a ler a biografia escrita por Marcelo Souto Maior ou viu o filme baseado nesta obra, alcançou uma ideia por mais superficial que tenha sido, do tamanho que foi a labuta do casal Rivail diante da missão de revelar a toda a humanidade, o legado doutrinário espiritista. Um trabalho que se estendeu de 1857 a 1869 e que, diferentemente do que somos acostumados a ler, para além das 5 obras da codificação que constituem o que se convencionou chamar de Pentateuco espírita, de acordo com o que defendem vários estudiosos do Espiritismo, na verdade se desdobrou num conjunto de 32 obras, entre livros, opúsculos e fascículos mensais de revistas (depois reunidas em volumes anuais), de abril de 1857 a abril de 1869, aos quais se acrescenta, ainda, o livro “Obras Póstumas”, publicado por seus sucessores.

O fato foi que, ao resistir a todo o tipo de ataques veementes, os quais, vale ressaltar, vinham de todos os lados, inclusive, como descreve o próprio Kardec, até mesmo de alguns daqueles que se definiam como confrades espíritas, Rivail deu uma indiscutível demonstração e testemunho do quão preparado ele estava para a missão sagrada que lhe foi reservada por Deus e, para a qual contou com o amparo não apenas da espiritualidade maior, mas com o auxílio do próprio Jesus que se manteve a frente de todo o trabalho de codificação do Espiritismo, assim como se matem a frente do destino deste planeta que, como bem sabemos, atravessa um de seus momentos históricos mais conturbados e marcantes dentro da linha de evolução, de regeneração.
Portanto, finalizo aqui minhas palavras, agradecendo e reverenciando a memória de Hipyte Leon Denizard Rivail, um ser que merece todo o nosso respeito e profunda admiração. E uma das maneiras de honrar sua memória, não resta dúvidas de que é zelar pela integralidade dos ensinos espíritas, não apenas propagando-o, levando-o a um maior número possível de almas, mas primando pela sua essência, resgatando ao Maximo possível, a gênese do postulado filosófico-espiritualista do Espiritismo, esse que, assim como foi dito em relação ao próprio Rivail, ainda permanece sendo ilustre desconhecido, ou para não sermos exagerados, ainda pouco conhecido, inclusive, por muitos dos seus adeptos e simpatizantes.