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Espiritismo, sem proselitismo!

26 de Março de 2018 às 11h35

Um dos aspectos negativos que acompanham as mais diversas correntes religiosas ao longo do tempo, tem sido o proselitismo. Trata-se de algo que, vale dizer, para além da forma mais explícita e que consiste na tentativa de conversão insistente e forçosa, também se manifesta, por vezes, de maneira mais branda ou, porque não dizer, disfarçada e que, no fundo tem o mesmo intento que consiste em exaltar determinado sistema de crença como o mais credível ou salvacionista para a humanidade.

E nem mesmo o Espiritismo que tem na aplicação do bom senso um de seus princípios basilares mais propagados, tem escapado desse tipo de atitude por parte de muitos de seus adeptos. Não são raras as mensagens de cunho proselitistas que circulam no meio espiritista e que enaltecem a Doutrina Espirita como sendo a mais autêntica e eficaz corrente espiritualista detentora da verdade suprema e salvacionista para a humanidade. Mensagens essas que, quase sempre, são atenuadas por um discurso de falsa modéstia e que em geral se valem de enunciados do tipo: “sem querer desmerecer as demais religiões existentes... “. Quando não:” “com todo o respeito àqueles que professam outras correntes de fé, mas o Espiritismo...”

Não bastasse, parece multiplicar-se por entre as searas espíritas, o número de profitentes, especialmente entre os expositores espiritistas, a enaltecer o Espiritismo como a doutrina filosófico-religiosa por excelência, esquecendo-se esses um detalhe importante. O fato de que, a missão do Espiritismo, segundo nos assevera o próprio Espirito de Verdade em O Evangelho Segundo o Espiritismo, é o de enaltecer o Cristianismo, em nome do qual este se coloca a serviço, revelando-se um dos instrumentos a mando do próprio Jesus para tal. Algo, aliás, explicitado nesta passagem extraída contida no próprio E.S.E: “Venho como outrora, entre os filhos desgarrados de Israel, trazer a verdade e dissipar as trevas...Todas as verdades se encontram no Cristianismo; os erros que nele se enraizaram são de origem humana..” (grifo nosso). Assim como são também de origem humana, todos os erros e equívocos que vem se enraizando no movimento espírita e que, infelizmente, vem comprometendo em grande parte, a essência da mensagem espírita e afugentando muitos simpatizantes que ao se engajarem nos agrupamentos espíritas, terminam por se decepcionarem com determinadas posturas e práticas dos representantes da denominada Terceira Revelação.

Eis aqui um problema que precisa ser melhor observado pelos profitentes e divulgadores do Espiritismo. Não por acaso, foi levantado pelo próprio professor Hipollyte Léon Denizard Rivail que desde a fase inicial dos estudos acerca do Espiritismo e até mesmo, antes da oficialização deste enquanto corpo doutrinal, já advertia para os perigos do proselitismo, algo que, vale dizer, era uma marca muito forte nas correntes religiosas da época e que permanece até os dias de hoje. Falando do Espiritismo na América, em que destacava o trabalho do juiz Edmonds, de Nova York, Kardec transcreve parte de um texto escrito, três anos antes do advento d’ O Livro dos Espíritos que sintetiza a essência da mensagem espírita e bane toda e qualquer forma de proselitismo. Diz-nos o texto: “De nossa conduta depende nosso destino futuro e não de nossa adesão a esta ou àquela seita religiosa, mas de nossa submissão a este grande preceito: Amar a Deus e ao Próximo...”. A mensagem está contida em trecho de estudos da Revue Spirite editada em 1861, pela EDICEL, com base na tradução de Júlio Abreu Filho. No mesmo texto, o codificador, de maneira muito oportuna, também sintetiza o papel principal daquele que se diz espírita e, portanto, um cristão genuíno. Os espíritas, diz Kardec, “têm uma bela e importante missão a cumprir: espalhar a luz em seu redor”. Eis a missão de todo discípulo do Cristo, aquele que, vale sempre lembrar, não apenas não criou religião alguma, como instituiu o amor maior, como única forma de conversão espiritual.


Em mensagem transmitida recentemente e publicada na internet, na qual discorre sobre a identidade do espírita, o escritor e expositor André Trigueiro comenta que o mais importante não é ser espírita e sim, fazer bom uso do Espiritismo enquanto uma das ferramentas úteis para o objetivo primordial que é o autoaprimoramento moral, André Trigueiro diz algo que me chama a atenção e que, a priori, parece ser incompreensível e até contraditório, uma vez que a definição de espírita apresentada por Kardec diz respeito justamente àquele que se esforça para, por meio de sua transformação moral, domar suas más inclinações. Ao meu ver, a ideia expressa pelo eminente expositor espírita vai além do pertencimento doutrinário e nos chama a atenção para o fato de que, muito mais importante que erguermos a bandeira do Espiritismo de forma proselitista, como muitos o fazem, repetindo uma prática muito comum em todas as searas religiosas é, de fato, tentarmos traduzir e exemplificar o conteúdo doutrinário espírita por meio de mudança de comportamentos e atitudes que possam atestar o poder de transformação espiritual de todo aquele que está verdadeiramente em comunhão com o Cristo que permanece sendo o nosso caminho da verdade, da vida e para a revolução humana e espiritual de que tanto necessitamos.