1 – Marcel, você como jornalista apura e levanta dados e fatos sobre os temas trabalhados. Na Doutrina Espírita o que de fato lhe intrigou mais em todos estes anos de estudo e descobertas?
O que mais me impressiona na doutrina é a rede de apoio que ela propaga em todo o país e no exterior. Encaro cada casa espírita como um núcleo de estudos e um polo de solidariedade, bastante alinhados com os valores centrais defendidos por Kardec.
“Fora da Caridade Não Há Salvação”, ele declarou e – com cuidado de fiscal e entusiasmo de divulgador da doutrina, missões difíceis de conciliar – deu início a esta rede de “trabalho em favor do outro”, que encontrou aqui no Brasil o terreno mais fértil para prosperar, graças a exemplos vivos como os de Chico Xavier.
Ao declarar que a vida continua para além do corpo e atestar que somos a soma de experiências ou vivências passadas, o Espiritismo aumenta a responsabilidade de quem encara esta passagem por aqui como uma oportunidade de evolução e aprendizado.
Esta lógica do Espiritismo – baseada no trabalho e no cuidado com o outro – me atrai mais do que os fenômenos mediúnicos, sujeitos a fraudes ou autossugestão.
Neste ponto – e em muitos outros – eu me identifico com o professor Rivail. Talvez por isto mesmo, por me identificar com ele, mergulhei no estudo de sua vida.
O que me moveu, durante todo o tempo, foi uma pergunta-chave: o que fez o educador cético – que rejeitou, a princípio, fenômenos como as mesas girantes – mudar de vida e de nome, aos 53 anos, para dar voz aos espíritos?
O que o transformou no principal divulgador e fiscal do movimento e o fez enfrentar adversários da Imprensa, da Igreja e das Ciências, ao longo de mais de uma década de trabalho duro e incessante?
2 – Vamos encontrar respostas a estas perguntas nas telas do cinema?
Sim. O filme de Wagner de Assis reconstitui os principais marcos da transformação do professor Hippolyte Léon Denizard Rivail em Allan Kardec. A descrença dos primeiros tempos (quando definia as “almas do outro mundo” como meras superstições), sua resistência a investigar as “mesas girantes” (que encarava como truques de ilusionismo), sua decisão de usar métodos científicos para por a prova as mais diversas médiuns de diferentes idades e classes sociais e, finalmente, sua convicção na presença e influência dos espíritos, a quem passa a “entrevistar” para gerar a obra fundadora da doutrina: “O Livro dos Espíritos”. Não por acaso o slogan do filme é “A História por trás do Nome”. É esta história – a história do “nascimento” de Allan Kardec – que o filme reconstituiu.
3 – Nas pesquisas realizadas na Biblioteca Nacional apontaria alguma descoberta inusitada no trabalho da revelação da doutrina dos Espíritos trazido por Kardec?
Quando mergulhei na leitura e releitura das edições originais da “Revista Espírita”, fiquei muito impactado por alguns dos textos assinados por Kardec. Textos de missionário (divulgador da doutrina) e de fiscal também. Um deles, em especial, me marcou bastante. Foi uma resposta de Kardec aos ataques à doutrina, feitos por integrantes da Imprensa e das Ciências, muitos deles marcados por ironia. Respaldado por cartas vindas de todo o mundo – algumas delas assinadas por leitores que desistiram de se matar depois de ler obras como “O Livro dos Espíritos” – , Kardec desabafou em seu artigo: “Vocês estão rindo de que? Será que não percebem? O materialismo mata!” Neste mesmo texto, ele disse que trocaria todos os títulos, diplomas e honras da carreira de professor e ex-membro da Academia de Ciências por uma única carta destas. Testemunhos de quem encontrou novos sentidos e significados para a própria vida ao entrar em contato com o Espiritismo.
4 – Professor Denizard Rivail sendo levado às telas de todo o país. O que podemos esperar desta história?
Transformação. Espero que muita gente saia do cinema e vá às livrarias adquirir as obras de Kardec. Que respostas ele conseguiu trazer “do mundo de lá”? Como ele conseguiu traduzir, em seus livros, a dinâmica e a lógica do chamado Mundo Invisível? O filme tem tudo para despertar a curiosidade do público leigo e estimular ainda mais os estudos e práticas dos discípulos de Kardec.
5 – Na dedicatória do livro Kardec já traz a aspiração para transformar a obra em filme. Como é para o autor ver seus livros sendo base para produções cinematográficas?
Fico muito feliz – honrado mesmo -, mas tomo muito cuidado para ficar com os “pés no chão”. O mérito por estas adaptações não é meu. É de Chico Xavier e de Kardec, que construíram trajetórias únicas ao longo de suas jornadas. Trajetórias marcadas por dois sentidos raros, que exigem foco e coragem: o sentido de Missão e o sentido de Doação. Só missionários como eles constroem trajetórias assim. Histórias de vida que merecem filmes com a qualidade, e o requinte de reconstituição histórica, de “Kardec – a história por trás do nome”. FEB