Todas as manhãs, a filha encontrava a mesa posta, o café quentinho e pão fresco.
O pai acordava mais cedo e providenciava tudo para que ela pudesse fazer o desjejum com calma e saísse tranquila para o trabalho.
A mãe havia morrido, há pouco tempo, e ele se desdobrava para amenizar a tristeza da jovem. Dessa forma, sua própria tristeza também era um pouco diminuída.
Quando ela retornava à noite, cansada da longa jornada de trabalho e estudos, encontrava o pai esperando por ela, cochilando no sofá, na frente da TV.
Nos finais de semana, faziam a limpeza da casa juntos.
Durante meses, a rotina dos dois foi assim. Um apoiava o outro para superar o luto.
O pai se esforçava para que a filha tivesse qualidade de vida e momentos agradáveis, mas percebia que ela vivia triste e abatida. Havia se afastado dos amigos e preferia ficar no quarto, dormindo.
Com o tempo, ela se isolou.
Preocupado, ele tomou uma decisão. Num fim de semana, chegou em casa com uma grande caixa de papelão cheia de furos. Chamou a filha e lhe entregou o presente.
Quando abriu, a moça deu um grito. Era um cachorrinho!
Vi esse filhote numa feira de adoção. Disse o pai. Ele me conquistou na hora. Acho que vai ser um bom amigo.
O pai não sabia mais o que fazer para animar a filha. Temia que ela adoecesse. O cão faria companhia, exigiria cuidados e a forçaria a sair para caminhar com ele.
O filhote recebeu o nome de Oré, que significa Amigo, na língua iorubá.
E realmente foi o início de uma amizade longa e cheia de alegrias.
A jovem acabou conhecendo pessoas com interesses comuns aos seus, por conta das caminhadas com Oré. Fez amizade com outros jovens, com quem compartilhava passeios nos parques, sempre com os amigos de quatro patas ao lado.
Seu pai ficou feliz, sentia-se aliviado ao vê-la voltando para o mundo.
Com o tempo, ela foi se modificando, demonstrando novos interesses e idealizando planos de vida.
Fez um curso sobre animais de terapia, outro de adestramento, um de comportamento animal e passou a atuar na área da saúde, com terapias assistidas por animais.
Anos depois, se deu conta de que a simples presença de Oré em sua vida havia despertado seu olhar para o sofrimento humano e as diferentes maneiras de abrandar a dor, minimizar o sofrimento e trazer alívio para as pessoas.
Ela havia deixado de olhar para a própria tristeza, e seu egoísmo ficara para trás.
Pensou no quanto aquele gesto de seu pai, presenteando-a com o cão, anos antes, havia provocado uma transformação profunda em sua forma de enxergar o mundo.
Também se deu conta dos pequenos gestos do pai que facilitavam sua vida e a tornavam menos árida.
Sentiu profunda gratidão por aquele homem que tanto fez para que ela não sofresse e se envergonhou por ter sido tão pouco atenciosa para com ele.
Então, todas as manhãs, passou a esperar seu pai com a mesa posta, o café quentinho e pão fresco.
Ao lado da xícara, um bilhete de Bom dia e uma mensagem de agradecimento e de amor àquele pai que tanto fizera por ela.
Redação do Momento Espírita.
Em 3.3.2016.