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O preço do silêncio

04 de Abril de 2018 às 08h35

Werlany Maciel (@werlany_maciel

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O PREÇO DO SILÊNCIO 
Foi com grande satisfação que, em reunião fraterna no plano espiritual, revi meu amigo José, de quem me afastara havia algumas encarnações.
Juntos, tínhamos vivido em tempos passados, e eu me lembrava com certo constrangimento de certas passagens levianas que havíamos cometido.
Na verdade, eu me sentia mudado e, um pouco mais experiente. Tentei afastar os pensamentos desagradáveis. José, companheiro leviano e irresponsável, apesar de bom e generoso amigo, tinha o defeito de falar demais. Quando em palestra com alguém, esquecia a noção do equilíbrio e comentava assuntos íntimos, envolvendo reputações, boatos e acrescentava, no auge do entusiasmo, novas nuances para colorir o assunto, sem perceber, resvalando para a calúnia. Muitas vezes causara intrigas e dissensões, separações e litígios entre as criaturas.
Fazia-o mais por leviandade do que pelo desejo de causar dano. Geralmente arrependia-se depois, mas o mal já estava feito.
Abracei-o, pois o apreciava, e procurei armazenar argumentos a fim de neutralizar-lhe o verbo intempestivo.
José abraçou-me e juntamo-nos ao resto do grupo em agradável conversação. Para minha surpresa, José apenas pronunciou algumas palavras sérias, pausadas e, eu diria, com alguma dificuldade. Completamente diferente da pessoa que eu havia conhecido antes. Estava mais equilibrado e mais feliz. Em seu olhar havia entendimento e doçura. 
Satisfeito constatei seu progresso espiritual. 
José colocando sua mão em meu braço, falou:
_ Estou satisfeito de vê-lo bem disposto e sei que também nota que estou diferente.
_ Tem razão, José. Está muito melhor agora. Na verdade todos nós temos progredido. É da lei.
_ Assim é. Entretanto, toda conquista tem um preço que é preciso pagar. E pagamos com antecedência. É PRECISO DAR PARA RECEBER.
_ Mas noto que tem dificuldades de se expressar. Você que era tão versátil e prolixo!
_ Sabes que muitos males que causei com a língua a serviço da irresponsabilidade. Esse defeito representava para mim sério motivo de preocupação. Vivia atormentado, enredado pelas dissensões e intrigas que articulava, perseguido pelas consequências dessas atitudes e sentindo-me impotente para dominá-las. A cada existência, quando voltava pra cá, sentia o remorso aumentar, vendo a lista de resgates crescer, dificultando meu progresso espiritual.
Em outros campos havia conseguido muitos progressos, mas quando chegava a essa fraqueza, nada conseguia.
Resolvi submeter meu caso às entidades superiores que carinhosamente se dispuseram a estudar minhas possibilidades.
Chegaram um dia a solução. Depois de ouvir e assistir, um pouco envergonhado, ao estudo das minhas atitudes passadas, meu mentor considerou:
_ Acabamos de estudar o seu caso. Chegou a tal ponto de reação motora que sua vontade é quase inócua para evitar o deslize. Por isso, torna-se preciso paralisar o veiculo do erro, para aprender de novo e manter o controle. Aconselhamos uma reencarnação em que, venha a perder a língua. O que será fácil conseguir, porque como vê ela já está danificada e envolvida pelas vibrações negativas com que a brindou. Como está resolvido a lutar para melhorar, conseguimos, com auxilio da prece, esta dádiva do Senhor.
_ Confesso que senti grande abalo. Entretanto, quanto mais pensava no caso, mais compreendia que tinham razão. Renasce na França, filho de fidalgos. Contudo, esquisita moléstia paralisava-me a língua, iimpedindo-me de falar como outras crianças.
À princípio, lutei para fugir à doença, que me fazia sofrer. Porém, aos poucos, fui me habituando a ela. Tive paralisia completa. Não conseguia emitir um som. Porém me sentia feliz, como se alguma força interior me sustentasse. As tentações eram maiores pois as pessoas sabendo que não falava não se importavam de tratar de assuntos graves na minha presença. Fui testemunha de intrigas e mentiras, ódios e perversidades, luxúria e egoísmo, que regurgitavam nos salões da corte. Mas assim fui aprendendo a conhecer a BELEZA E A FORÇA DO SILÊNCIO, e muitas vezes, presenciando p desenrolar dos fatos, agradecia a Deus não ter podido falar sobre o assunto. COMECEI A NOTAR O PERIGO DAS PALAVRAS E SUAS CONSEQUÊNCIAS.
Cheguei ao fim da existência mais equilibrado e sereno. Porém, uma existência não foi suficiente. Reencarnei de novo ainda com paralisia parcial da língua. Submetido a longo e doloroso tratamento para falar, recuperei o uso do órgão enfermo, mas, com auxilio do Alto, permaneceu um resquício da atrofia, e eu sofria terrível gagueira. Mesmo com vontade de falar sentia vergonha. Por fim, voltei nesta encarnação com o órgão normal, porém, conservando a experiência passada, já não sentia vontade de falar. Fui envolvido e tentado por todos aqueles que colecionam os defeitos alheios e os exibem. Com a graça de Deus, consegui vencer - e continuou sorrindo: _ Ha muitos anos que não falo tanto como hoje! Estou exausto!
Respondi: _ Na verdade, alcançou o progresso desejado, mas a que preço! - terminei, um pouco chocado com seu sofrimento.
_ Ora, ora, meu amigo! Quantos acidentes seriam evitados se cada um pudesse comandar plenamente seus veículos na vida? E, se não conseguem detê-lo e ele se torna perigoso, é lógico que deve ser recolhido à oficina para conserto. Hoje, verificando o beneficio do calar no momento oportuno, acho irrisório ter dado apenas uma língua para pagar o preço do silencio!
E eu fiquei silencioso, penetrando fundo na beleza da lição.
Espírito: Marcos Vinícius 
Instagram: @espiritacg